Ampliando o tema.
O ramo do Xamanismo que estudo e sei que o mesmo ocorria em muitas das chamadas escolas de mistérios na Grécia antiga e no Egito, Índia e China levam vc a viver o que está estudando.
O conceito de estudar e aprender algo no Xamanismo e em tais escolas é diferente da abordagem hoje existente no ocidente.
Hoje se trabalha com idéias, com palavras, com textos, com informações.
Quando falamos que a iniciação é de boca para ouvido, podemos, equivocadamente pensar, que seja a transmissão de conhecimentos verbais.
Nada mais distante.
No Xamanismo, nos ramos de Magia e em algumas escolas que conheço quem lhe inicia cria condições, cria o "cenário" no qual vc vai presenciar diretamente o tema que está estudando. Um (a) iniciador é alguém que já vivenciou o tema estudado e agora vai te expor ao mesmo tema.
Para nós aprender Magia por livros seria tão "sensato" como aprender a nadar no mar, via curso de correspondência. Como dificilmente o autor do curso vai receber uma carta do "afogado" avisando das falhas do método, pode até acreditar e fazer outros crerem que funciona, mas nada mais distante da realidade.
O problema é que tem muita gente presa na visão moralista da evolução.
Evoluir é ser bom, é ser "santo" e por aí vaí. Mas eu gosto mais de uma definição que ouvi alhures:
"Evoluir é transformar vida-energia em vida-consciência".
Tem riscos, é um caminho árduo e trabalhoso. Como chamei a atenção em outro mail, parece que
muitos esqueceram completamente que as antigas escolas de sabedoria tinham (e ainda têm) testes iniciáticos, provas, para testar a têmpera de quem se propõe a trilhar tais caminhos. Nada mais distante da realidade que essa idéia que o "esoterismo é para todos (as) e que "basta ter boa vontade".
Nem os cristãos com toda sua pataquada falam isso, ou se esquecem do "muitos os chamados, poucos os escolhidos" e da "porta estreita"? Não se trata de uma eliminação do esoterismo, é outra coisa, é a percepção clara que um caminho precisa de base para ser trilhado e se não nos propusermos a gerar esta base em nós, vamos ficar sempre na periferia do esoterismo ou pior, caindo nestas pseudo escolas e pseudo linhagens que tem muita fantasia e "frisson", mas pouco agem em relação a profunda e avassaladora transformação que nos permite abandonar o que fizeram de nós e ir em busca da autoconstrução.
Um sheik que conheci dizia:
O CAMINHO deve ser algo decepcionante quando encontrado, algo assustador no princípio, pois se corresponde exatamente ao que se busca só pode ser falso, pois quem busca? A falsa personalidade, com todas suas angústias e carências. Assim uma certa perplexidade sempre toma aquele (a) que se defronta com o CAMINHO, perplexidade que logo se desvanecerá a medida que caminhante e caminho se tornarem mais e mais unos".
O sábio Yaqui D. Juan Matus também afirmava que o "benfeitor" logra o aprendiz, fazendo-o crer que o importante é algo sem valor, mas que lhe é posto a frente, enquanto o verdadeiro Trabalho está sendo feito. Assim de nada adianta ficar lendo sobre elementais, o valor está em vivenciá-los, na prática.
Não que a leitura seja sem valor, ao contrário, a leitura pode te alimentar com a experiência acumulada de gerações de magistas e evitar que erros sejam cometidos, mas vc só poderá dizer que compreendeu o tema dos elementais quando conviver com eles, quando operar no mundo dos mesmos e for além das formas fantasiosas que eles adotam para quem ainda está começando na arte.
A Magia é um campo infinito, amplo e em expansão e como seria diferente se vivemos num universo amplo e em expansão e tão vasto que para nossos referenciais o termo infinito é o único que se adequa a qualquer mensuração?
Há muitas armadilhas que podem desviar alguém do Caminho, que podem nos deixar presos a um detalhe quando a totalidade nos espera. Há uma analogia interessante. Nosso estado normal de vida é estar preso a um quarto de uma vasta casa. A Magia nos revela que há uma porta. Há outros quartos, há uma cozinha, uma sala, alguns chegam até a sala onde a lareira está acesa e o frio do quarto pode ser esquecido. Mas o que poucos percebem é que, fascinados com a imensidão da casa, apenas ampliaram sua prisão, agora não mais presos no quarto estão, mas continuam presos na casa.
A tradição mágica profunda tem aí seu valor. Nos ensina a encontrar a janela, ou a porta da rua, que nos permitirá não apenas sair de um quarto para ficar preso noutro, por mais confortável e agradável que o novo quarto ou sala possa parecer, mas nos ensina como escapar definitivamente da casa, audaciosamente indo além do humano, além dos limites.
Para os magistas com os quais estudo esta é a maior armadilha dos praticantes modernos, a mesma que em outros tempos tantos caíram. Após ficarem presos por tanto tempo em escuro e apertado quarto, o fascínio de encontrar um corredor, outros quartos, outras dependências é muito forte e passaram a chamar esses outros cômodos de "plano espiritual", "níveis mais elevados", crendo que apenas se deslocar para estes outros "cômodos da casa" era "evolução", era "espiritualizar-se".
Mas o desafio profundo continua, fora da casa, nos esperando, esperando aos (às) poucos(as) que tem a coragem para ir além e abandonar as armadilhas antropomorfizadas que é o legado que nos prende por eons e realmente prosseguir na aventura da evolução, indo além dos mundos humanos ou dos deuses.
Assim os magistas que tenho partilhado vivências consideram que no princípio é um caminho válido treinar nos outros quartos, podemos encontrar roupas mais quentes para enfrentar o clima inóspito de fora da casa, podemos encontrar mantimentos na dispensa que nos sustentarão até aprendermos a conseguir nosso próprio alimento fora da casa, enfim podemos ir aos outros cômodos da casa como treino, como desenvolvimento, mas nunca nos prendermos e nos limitarmos a eles.
Assim, visitar os mundos que nos cercam, as várias realidades que nos interpenetram, tudo isso tem valor de treino. Mas o verdadeiro mistério da morte não pode ser assim resolvido, esta iniciação é final, é plena e a verdadeira partida é sem volta. Antes disso estaremos apenas nos limites do conhecido, quer o percebamos ou não.
A verdadeira morte ainda não ocorreu e não resta dúvida que muitos são capazes de continuar vivos depois da morte, quando são vivos na vida, pois que estranha mania essa de considerar que morrer dá vida e identidade a quem nunca teve isso, a quem passou pela vida como autômato, como extensão biológica de máquinas e sistemas. Me lembro quando, ainda espírita, tive meu primeiro contato com estas concepções. Fiquei revoltado, pois tinha forte a idéia de "justiça cósmica", um "deus justo que ajuda seus filhos" e outros conceitos profundamente imaturos. Rindo, uma psiquiatra que me iniciou em certa linhagem rosa-cruz comentou comigo quando lhe expus minha perplexidade:
"Enquanto não estiver pronto para abandonar estes brinquedos não estará pronto para amadurecer".
Hoje entendo o que ela quis dizer. O problema é que buscamos conforto em muitas explicações e a Eternidade é vasta demais, ampla demais, o Caos envolve o Cosmos e precisamos ser fortes e corajosos para realmente ir mais longe que as "visões consoladoras".
Nuvem que passa