terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Abhyasa




Muitos caminhos levam à Roma.

Roma é um anagrama da palavra Amor.

Muitos caminhos conduzem ao Amor.

O Amor é meta, e também caminho.

Caminhar com Amor é a meta.

Quem caminha com Amor anda com Deus, 

e torna-se aquilo mesmo que é - o Ser.

Eis a suprema Yoga.


O Amor é o arco.

A alma é a seta.

O Ser é o alvo.

‘Cumpre feri-lo constantemente’.

Eis abhyasa - a disciplina é a salvação.

DR

Sobre a vaidade



Diferente da noção de pecado da religião cristã o Xamanismo Guerreiro (X.G.) compreende a vaidade como um paradoxo, como um centro de onde surge tanto o positivo quanto o negativo quando se trata de alcançar o núcleo daquilo que nos define.

Talvez a grande diferença para o X.G. está no fato de seus praticantes operarem com uma vaidade que não necessita de aprovação do outro, de reconhecimento social ou de qualquer impulso exterior para tornar-se um elemento de realização pessoal.

Para o Xamanismo Guerreiro a vaidade não é pecado, é uma energia de ordem emocional que precisa ser direcionada não por normas morais e sociais, mas para o propósito abstrato de desenvolver todo o potencial humano.

Assim há para o XG uma vaidade que nos serve e há uma vaidade imprestável. Nossa tarefa é desnatar uma da outra. Mas ela não são duas vaidades, dois tipos de vaidade, há uma vaidade apenas que precisa ser direcionada não para atender aos ditames da ordem social mas para alcançar o intento da liberdade de ser.

"— A vaidade não é algo simples e ingênuo — explicou. — De um lado, é o núcleo de tudo que é bom em nós e, por outro, o núcleo de tudo que não presta. Livrar-se da vaidade que não presta requer prodígios de estratégia. Através dos tempos, os videntes renderam homenagens àqueles que conseguiram" - O Fogo Interior, de Carlos Castaneda (← download no hiperlink).

Essa vaidade que presta talvez surja de uma satisfação pessoal, de uma realização interior, de uma felicidade que brota do guerreiro ou da guerreira quando segue aquilo que o nagual Juan Matus chamou de "o caminho do coração" sem que haja a necessidade ou a carência de um carimbo sociocultural.

Sobre a vaidade imprestável

A maior dificuldade que enfrentamos ao informar as pessoas que elas estão sendo enganadas é a vaidade, pois ninguém quer acreditar que foi enganado por tanto tempo sem perceber que estava sendo.

A maior prova disto é quando a informação revelada se dá no âmbito das relações cotidianas, pois ninguém quer acreditar que o outro, que é como você, mais um na multidão, está de posse de um conhecimento desse nível, então você acaba por ser taxado de teórico da conspiração ou paranoico de plantão. Mesmo que as informações sejam passadas com clareza, lógica e evidências o aparente ceticismo está cimentado numa vaidade tão estruturada que é muito difícil a pessoa ceder diante de argumentos mesmo cabais.

Assim uma definição possível de vaidade é o culto do reflexo das próprias crenças.

Fanatismo, ceticismo, estupidez e paranoia são apenas variações conceituais da mesma vaidade.

O principal objeto de culto dessa vaidade chama-se TV, que se tornou uma projeção na mente da maioria das pessoas. Ainda há tempo, desligue-a. A gente se vê por aqui, ou por aí.

Contudo, a informação pura e simples, mesmo embasada em dados reais não é suficiente para amparar novas decisões, pois estas não são tomadas no nível puramente racional, precisam atingir camadas mais profundas da psique. Sabedores disso alguns, desde o início do século passado, amparado nas teorias de Freud, resolveram utilizar tal informação para simplesmente manipular as pessoas em seus pontos mais fracos: vaidade, luxúria e medo.

Assim uma mulher pode ter mais de 40 pares de sapato, um homem ter um potente Porsche para trafegar no trânsito de Sampa e um humilde trabalhador pode torcer por seu time de jogadores milionários simplesmente porque isso os faz se sentirem do jeito que a propaganda lhes sugeriu, mesmo que seja absolutamente desnecessário e até mesmo completamente absurdo.

O consumismo não é o consumo de coisas, mas sim de emoções.

Assim nós, as pessoas, nos tornamos produtos que consomem produtos para satisfazer desejos e emoções artificialmente induzidas. Por exemplo: a emoção propiciada pela certeza e pelo senso comum nos dá uma sensação de (pseudo)segurança e dizemos em alto e bom som: - Teoria da conspiração! E assim seguimos um comando sintático, um clichê produzido pelo sistema dominante. Consumimos a produção intelectual do sistema sem nos darmos conta. Nos acreditamos bem informados quando somos apenas bem domesticados.

Vaidade, vanitas, vanus, vazio, futilidade, ilusório são palavras interligados ao consumismo atual, onde consumimos a nós mesmos por nada, esquecendo do segundo princípio da espreita de si: eliminar tudo aquilo que é supérfluo em nossa vida, fazendo-a convergir assim para o propósito maior: a liberdade de perceber.

Como diz o diabo de Al Pacino no filme Advogado do Diabo: a vaidade é o meu pecado predileto.

A sorte é que alguns de nós estamos conscientes, em certo nível, de nossa própria vaidade. E podemos rir dela.

DR



O Guardião - uma história sobre a espreita de si


No Judaísmo existe uma escola rebelde de mistério chamada Hassidismo. Seu fundador, Baal Shem, era um ser estranho. A meia-noite voltava do rio. Essa era sua rotina, porque no rio, de noite, havia uma calma e uma quietude absolutas. Sentava-se ali, sem fazer nada – apenas observando o seu próprio ser; observando o observador. Essa noite, quando voltava, passou pela casa de um homem rico e o vigilante estava de pé em frente à porta. O vigilante estava intrigado porque a cada noite, exatamente a mesma hora, voltava esse homem. Saiu e disse:

- Perdoe-me a interrupção, porém já não posso conter minha curiosidade. Uma pergunta me persegue dia e noite. O que fazes? Para que vais ao rio? O segui muitas vezes e não há nada; a única coisa que fazes é sentar-se ali horas e horas, e depois voltas à meia-noite.

Baal Shem respondeu:

- Já sei que me seguistes várias vezes, porque a noite é tão silenciosa que pude ouvir teus passos. E sei que todos os dias te escondes atrás do portão. Porém não apenas sentis curiosidade por mim, eu também sinto curiosidade por ti. O que fazes?” O guardião contestou:

- A que me dedico? Sou um simples vigilante.

Então Baal Shem lhe disse:

- Deus meu, me falastes a palavra chave. Minha ocupação é essa também.

O guardião disse:

- Porém não entendo; se és um vigilante terias que estar vigiando alguma casa, algum palácio. Que estás vigiando sentado na areia do rio?

Baal Shem respondeu:

- Existe uma pequena diferença: você vigia que nada de fora entre no palácio; eu simplesmente vigio a este vigilante. Quem é esse vigilante. Esse é o esforço de toda a minha vida; vigio a mim mesmo.

O guardião lhe disse:

- Porém esse é um trabalho muito raro! Quem lhe vai pagar?

E ele respondeu:

- A felicidade é tanta, o gozo é tão grande, é uma benção tão imensa que é uma recompensa em si mesma. Apenas um momento e todas as riquezas do mundo não são nada em comparação.

O vigilante disse:

- Isso é muito raro... eu passei a vida vigiando e jamais topei com uma experiência tão formosa. Amanhã à noite vou acompanhar-te, quero que me ensines, porque eu sei como vigiar, porém, me parece que faço isso numa certa direção e você olha para uma direção diferente.

Osho.


segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

Da obsessão (da ob_sessão) ou o mal consome a si mesmo.



Todo mundo acha que a obsessão ocorre de uma pessoa em relação a outra ou a um objeto, como a inveja de Salieri em relação a Mozart ou a cobiça fatal de Midas por ouro, mas a obsessão é como um buraco negro dentro da pessoa, um desejo da alma, um defeito psicológico e uma emoção negativa que foi tornada tão forte que galvaniza toda a vida da criatura naquela direção, fazendo-a entrar em desequilíbrio, fazendo com que todas as áreas de sua vida sejam destruídas e desequilibradas, já que o buraco negro criado na mente da pessoa é tão forte que tudo o mais não possui força frente ao poder de atração, frente a força gravitacional daquele desejo que a tudo galvaniza, a pessoa não pensa em outra coisa, não sente nada mais, fica antes de tudo obcecada por si mesma e por seu desejo fortalecido numa escala exponencial, exatamente como se houvesse um buraco negro na alma.

Assim a obsessão é antes de tudo uma forma de auto-obsessão e o obsessor mais forte é justo a pessoa que foi engolida por si mesma, por um desejo desequilibrado, por uma emoção negativa fortalecida ao longo do tempo, por um defeito psicológico que simbolicamente é como um demônio que lhe tragou a alma.

Os casos mais flagrantes, pois são públicos, são os de políticos que ao longo do tempo, ao envolverem-se em esquemas de corrupção e no jogo do poder movidos pelos desejos mais torpes, tem a própria face desfigurada, como um reflexo da alma possuída pelo próprio desejo em desequilíbrio, sua aura aparenta desvitalização e seu olhar perde o brilho, tornando-se frio e opaco.

Mas não faltam exemplos de amigos e conhecidos que desequilibraram o seu viver movidos pela obsessão, na verdade pela auto-obsessão. Sejam motivações espirituais, políticas e pessoais, a obsessão nesses casos assumem contornos grandiosos, como causas, ideais ou projetos que por transcenderem o indivíduo o alienam de si, funcionam como um droga que faz o indivíduo não ver seus próprios problemas para viver os problemas alheios e até os problemas da humanidade.

Aliás, a origem da palavra obsessão é latina, vem de OBSEDERE,  “sitiar um local”. Já obcecado vem de OBCAECARE, “tornar cego”, de OB, “à frente”, mais CAECARE, “cegar”.

A pessoa está cega para tudo o mais, está fascinada pelo próprio desejo, como, por exemplo, no caso do invejoso, que tem mais interesse na infelicidade alheia do que na própria e não vê que isto o leva a própria infelicidade e destruição. A inveja é o próprio obsessor, um obsessor abstrato, e seu possuidor, na verdade possuído, é o obcecado. Isto configura a auto-obsessão.

Assim toda a emoção negativa cultivada, todo defeito psicológico fortalecido é a caverna do dragão, é o útero psíquico gerador de obsessores e obcecados.

Curiosamente um dos componentes da palavra obsessor e obcecado, OB, é o termo usado em magia (cabala hebraica) para indicar a corrente fatal, como nos diz Eliphas Levi em seu O Grande Arcano:

“Ob representa a vida fatal. É por isso que diz o legislador hebreu: Infelizes dos que adivinham por Ob, pois evocam a fatalidade, o que é um atentado contra a providência de Deus e contra a liberdade do homem.”

Assim todo o médium, adivinho, sensitivo fascinado por suas próprias previsões segue a corrente da fatalidade é está impregnado de Ob, vítima da corrente astral negativa. 

Junte-se numa pessoa a sensibilidade mediúnica, a obsessão de que natureza for e uma personalidade em desequilíbrio e temos aí um obsessor encarnado, um portador de um buraco negro psíquico, um devorador, nas palavras da Bíblia.

O homem ímpio cava o mal, e nos seus lábios há como que uma fogueira. Provérbios 16:27

Amas todas as palavras devoradoras, ó língua fraudulenta. Salmos 52:4

Romper o círculo obsessivo e viciado na própria alma depende do quão a vontade possa estar enfraquecida e se a vontade estiver muito debilitada a única salvação é uma ajuda externa suficientemente forte para fazer frente ao buraco negro dentro da alma da pessoa (auto) obcecada, antes que ela seja devorada por si mesma.

Daí provavelmente o ditado hindu: o mal destrói a si mesmo, tal como ilustra a história:

Shiva, o destruidor de mundos, passeava com sua esposa Parvarti, quando, de repente, surgiu um monstro e disse:

- Quero que sua esposa seja minha mulher!

Ultrajado com aquele insulto, o deus Shiva criou então um monstro dez vezes maior e mais ameaçador que o primeiro, forçando este a lhe pedir clemência.

Shiva, então, poupou a vida do primeiro monstro, que passou a ser seu devoto discípulo e disse ao segundo monstro:

- "Kirtimukha", ou seja: que o mal consuma a si mesmo!

E o monstro se auto-devorou.

Hoje, a máscara do demônio Kirtimukha (imagem em anexo) serve como escudo de proteção nas casas e templos dedicados ao deus Shiva.

domingo, 10 de dezembro de 2023

Não há explicação ou arcano zero


Há vezes em que a única explicação é esta:

Não há explicação.

E não ter explicação é apavorante.

Acho que o homem forjou a razão pelo medo diante do universo e de sua imprevisibilidade. E assim surgiu a religião, a mitologia, a filosofia, a ciência e a psicanálise. Sim, a religião é um esforço racional, um esforço por explicar e entender, uma teoria sobre a realidade assim como a teoria do big bang.

O mistério é muito apavorante.

Tão apavorante que mesmo Einstein diante da mecânica quântica não quis admitir e disse: Deus não joga dados.

A razão não passa de uma tentativa desesperada de explicar o inexplicável. Ela aplaca nosso medo disfarçado de curiosidade.

Ela cria a ilusão de que o entendimento é um processo que caminha para uma realização total, como a teoria de tudo, o entendimento da mente divina almejado por Einstein.

Dizem que Deus “é uma expressão de anseio pelo pai todo-poderoso, que cuidará de nós”.

A razão tornou-se um substituto para Deus.

A razão tornou-se um tirano que quer a tudo explicar, é o deus, reflexo de nossa autoimportância diante do Infinito. É o racional tentando sobrepor-se ao mistério, um jogo de dominação que entra na questão do masculino e do feminino.

Mas assim como não há ninguém para cuidar de nós também não há ninguém que possa nos explicar o mistério e o caos do Universo.

Tantas teorias, metafísicas, doutrinas, filosofias para quê? Um vasto menu que nunca satisfaz o cliente.

Mas aí entra a razão, que como a religião, não passa de um consolo, quando se crê que para tudo há uma razão de ser.

Porque nos é tão difícil aceitar que não há uma razão para tudo que acontece em nossas vidas?

Carma? Culpa? Pecado? Missão? Cuidado com tudo aquilo que te prende a um pretenso passado...há uma sombra que ronda e da qual pululam tais conceitos. Cuidado com tudo aquilo que quer te vincular a um futuro: Apocalipses, Profecias, Previsões. Se for para se prender que seja a isto: o aqui e o agora.

Você se ri? Então abrace o martelo: 

"Que importa que eu venha a ter razão? Eu tenho razão demais. — E quem hoje ri melhor também ri por último¹".

Pois é tudo o que vale para quem está vivo: aqui e agora, o preciso momento.

Sem o apoio de um deus e de uma razão que é do homem? Algo tão vasto que dá medo? Ou algo tão primitivo que não vale a pena? Ou apenas um bicho, como outro qualquer?

Nós que nos dizemos um animal intelectual não percebemos o que o intelecto é apenas um recurso de sobrevivência e um recurso que tem feito muito mais dano do que bem a nós mesmos. Tem nos levado a um mar de confusão e teorias onde acabamos enredados nos pensamentos, como se fôssemos uma presa de algo em nós mesmos, como se a mente fosse o labirinto de Creta.

Penso, logo existo? Mas quem pensa? Quem eu sou?

Há uma virtude na razão quando ela reconhece seus limites, mas quando ela vai além de si torna-se neurose, às vezes aneurisma, e aquém é apenas burrice.

Nunca ouvi uma frase mais insensata do que esta: seja realista!

Há algo em nós capaz de saber além de toda e qualquer explicação?

Surge uma das frases de Matrix: Não pense que é, saiba que é.

A razão se faz perfeitamente racional (desculpem a redundância justificada pelo ênfase necessária) quando se depara com os seus limites e descobre a humildade.

DR

Notas

¹ Friedrich Nietzche, Crepúsculo dos Ídolos, aforismo 43.

sábado, 9 de dezembro de 2023

Detonação de bomba nuclear a 300 milhões de anos atrás, Ragnarok e o estranho X.

"Mesmo o mais corajoso de nós raras vezes tem a coragem para o que realmente sabe..." - Nietzche, em  O Crepúsculo dos Ídolos.

Eis fato científico que me chocou até o fundo da alma, é difícil mesmo de acreditar, apesar de fatos e evidências científicas dispensarem por completo a fé, pois o fato fala por si mesmo.

Detonação de bomba nuclear a 300 milhões de anos atrás???

A 300 milhões de anos atrás não havia se quer humanidade, hominídeos ou algo semelhante, estávamos na época do supercontinente, Pangea, e do único oceano, Pantalassa, em pleno período Permiano (que tem cheiro e lembrança de banco de escola, bons tempos...), mas, segundo os cientistas, a Nasa e provas materiais recolhidas do solo pela sonda Rover Curiosity, que custou a bagatela de 2,5 bilhões de dólares, alguém detonou bombas nucleares, porém não aqui na Terra, mas no nosso vizinho Marte.

Sim! Alguém detonou bombas nucleares em Marte a 300 milhões de anos atrás!!!

Você pode imaginar as implicações disso?

Muitos dirão que isso é viagem da Helman´s Airlines, SQN, pois há evidências científicas suficientes para atestar tal fato e essas evidências científicas tem de novo cheiro e lembrança de banco de escola, pois estamos nos referindo ao último elemento da quinta linha da tabela periódica, terror de muita gente boa:

O estranho X! 

Sim, isso é o que significa o termo Xenônio! Vem do grego xénos, daí quem tem medo ou ódio de estrangeiro ser chamado de xenófobo.

Devo confessar que nesta Terra de meu Deus é assim que muitas vezes me sinto: um xenônio, moro na posição 54 da tabela periódica ou como diria o mestre Jesus: meu reino não é deste mundo.


Mas o que o estranho X tem a ver com detonação de artefatos nucleares em Marte?

Bem, você por acaso sabe como as agências reguladoras e fiscalizadoras de atividades nucleares identificam aqui na Terra se algum país está realizando experimentos nucleares?

Um dos métodos de detecção de atividades nucleares envolve o monitoramento de radionuclídeos, átomos que emitem radiação.

E adivinha quem é um dos candidatos a átomo radioativo que denuncia de forma específica e objetiva a detonação de bombas nucleares?

O estranho X! O xenônio!

Mas no caso, o que caracteriza a ocorrência de um detonação nuclear é um tipo específico de xenônio, que seria um isótopo particular do estranho X. É bom lembrar que um átomo pode ter diferentes isótopos (números diferentes de nêutrons). Assim podemos ter o xenônio 124 à 136 em termos de isótopos, mas em termos de elétrons e prótons ele possui 54 de cada.


E foi justamente o xenônio com o isótopo derivado de uma explosão nuclear artificial que foi encontrado em Marte, segundo o astrofísico John Brandenburg, que trabalhou para a Nasa e que em função desta descoberta escreveu um livro sobre o assunto: Death on Mars.

A primeira pergunta que surge é:

Quem a 300 milhões de anos atrás detinha tecnologia para fabricação de bombas nucleares?

Faz 70 anos que realizamos aqui na Terra detonação de bombas nucleares e o nível de radiação derivado de tais explosões não chega ao nível do que há em Marte, sendo que lá é duas vezes e meia maior que aqui na Terra.

A segunda pergunta que surge é:

Não estamos diante de uma prova irrefutável de vida extraterrestre?

Outra pergunta poderia ser:

Não estamos sozinhos em nossa estupidez destrutiva?

A detonação nuclear em Marte, que destruiu todo o planeta, com uma potência que não temos aqui na Terra em uma única bomba, teria sido o tal Ragnarok narrada pela mitologia nórdica? Bem, isso jogaria por terra a ideia de que o mito gira em torno do humano, como vemos em interpretações do famoso e aclamado mitólogo Joseph John Campbell.

Muitos estudiosos defendem a tese de que o Ragnarok já ocorreu. A própria humanidade atual é um exemplo disso na medida em que o humanismo, o antropocentrismo e o cientificismo se tornaram dominantes, equivalendo a um verdadeiro crepúsculo dos deuses (para ouvir a obra de Richard Wagner, o que me lembra a cena final do filme Excalibur, de John Borman), tradução da palavra Ragnarok.

Como essa descoberta não foi anunciada em grande escala, o que deveria ser haja vista a importância de tal fato em vários campos: exopolítica, geopolítica, segurança das nações, arqueologia, astrofísica, e por aí vai a coisa ficou escondida ou diminuída em sua importância. Parece que algo só é verdade quando sai na CNN, como diria uma cínica senadora estadunidense no filme G.I. Jane, mostrando que a verdade é coisa de ficção nesse nosso mundo.

Mas por falar em Ragnarok e Crepúsculo dos Deuses podemos voltar a citar Nietzche sobre aquilo que sabemos e não temos a coragem de assumir:

"Mesmo o mais corajoso de nós raras vezes tem a coragem para o que realmente sabe..."
 

O bruxo, homem só e sem pátria


Entrevista com Carlos Castaneda publicada em 1976
Fonte: Revista Veja nº356 -1976


Após quinze anos de lições, o brasileiro, talvez peruano ou americano, aprendeu a não ter biografia nem raízes.

Desde que começou a relatar em livros seus encontros com Don Juan, que remontam a 1960, Carlos César Aranha Castaneda transformou-se na mais invisível e impalpável personalidade literária da atualidade. Fragmentos incompletos de sua biografia apareceram nas duas únicas publicações a que concedeu entrevista, as revistas Time e Psychology Today, não se deixou fotografar nos últimos dez anos e não se preocupou em esclarecer algumas dúvidas cruciais. Assim, ele teria nascido no interior de São Paulo, no dia de natal de 1935, segundo disse ao Time. Mas, de acordo com a revista, o nascimento de deu dez anos antes numa cidade do Peru.
 
Comunicado desta descoberta, Castaneda reagiu de maneira impecável para um aprendiz de feiticeiro que aspira apagar sua identidade pessoal: "Estas estatísticas não significam nada. Importante o que nós somos, não o que éramos". Assim, com essa nacionalidade incerta e com uma idade que caminharia para os 40 ou 50 anos, embora certamente aparentasse menos, os únicos sinas da existência terrestre de Castaneda eram um Volkswagen e duas casas de sua propriedade, na Califórnia. No começo do ano passado, o estudante brasileiro Luiz André Kossobudzki, então bolsista de educação na Universidade da Califórnia (UCLA), encontrou-o num jantar beneficiente ao lado de personalidades literárias "normais", como Irving Stone e Irving Wallace. Quinze meses depois, no fim de março último, recebeu de Castaneda os negativos das fotos que o autor tirara no México, e que VEJA publica junto com esta entrevista exclusiva, à qual o entrevistado impôs a condição de que deveria ser publicada no Brasil antes de qualquer outro país. Kossobudzki recorda os seus encontros:

"Eu, minha mulher e mais quatro casais de bolsistas estrangeiros éramos talvez os únicos convidados ao jantar que não tínhamos os nomes gravados em alguma placa de honra. 

Tentamos, sem conseguir, um lugar na mesa de Castaneda, mas depois do jantar ele mesmo veio até nós. Disse-lhe logo que não acreditava ser ele brasileiro. Começamos a falar em inglês, mas logo depois ele se dirigiu até nós com lusitana fluência (inclusive sotaque) e afirmou ter nascido no interior do estado de São Paulo, numa cidade do vale do Paraíba, e que passara parte de sua infância em Juqueri* .Combinamos então nos encontrar novamente para uma feijoada, mas Castaneda desapareceu por vários meses. Um telefonema do seu agente literário informou que ele ainda estava interessado em me ver. 

Finalmente, conversamos três vezes, uma na minha casa e outras duas no campus da UCLA, onde ele trabalha de catorze a dezoito horas diariamente, em suas pesquisas sobre ético-hermenêutica (estudos da interpretação perceptiva de diferentes grupos étnicos). Castaneda aparenta ter 35 anos, 1,70 metros de altura e uns 70 quilos. Fisicamente, passaria por caboclo mato-grossense ou mesmo nordestino".

*Não existe nenhum município paulista com esse nome. Juqueri, no entanto, é o nome de um estabelecimento para doentes mentais no município de Franco da Rocha, na Grande São Paulo, que costuma ser confundido com o nome do hospital. Juquiri é o nome antigo do município de Mairiporã, também na Grande São Paulo.

Aprendendo a viver com a bruxaria
 
VEJA - Quando se lê sobre Don Juan, tem-se a impressão que ele é um homem pobre e com um vasto conhecimento da vida. O senhor poderia falar de sua surpresa ao encontrá-lo de terno em "Porta para o Infinito"?
 
CASTANEDA - Tremi de medo, pois estava acostumado a vê-lo somente em roupas de campo. Isto ocorreu na fase final dos ensinamentos e tinha uma razão de ser. Don Juan revelou-me que era proprietário de diversas ações na Bolsa de Valores, e tenho quase certeza que se ele fosse um homem tipicamente ocidental estaria vivendo em um apartamento de cobertura no centro de Nova York. Finalmente aprendi que as duas realidades poderiam ser divididas no que Don Juan denominava tonal (consciente) e nagual (que não se fala). Na realidade do consenso social, o bruxo, o homem de conhecimento, é um perfeito "tonal" - um homem do seu tempo, atual, que usa o mundo da melhor forma possível. Nós usamos história como uma forma de recapturar o mundo passado e planejar para o futuro. Para o bruxo, passado é passado e não existe história pessoal nem coletiva.

 VEJA - O principal de seu encontro com Don Juan está escrito no livro "The teachings of Don Juan"(na versão brasileira, a Erva do Diabo"), mas em lugar nenhum existe menção de exatamente onde estiveram. Seria possível uma descrição mais detalhada do local?
 
CASTANEDA - Na fronteira entre os Estados da Califórnia (Estados Unidos) e Sonora (México) existe uma cidade chamada Nogales. Partindo de Nogales, a rodovia principal passa pela cidade de Hermosillo, capital de Sonora, pela cidade de Guayamas e finalmente cruza a Estácion de Vicam. A oeste da Estação de Vicam, em direção ao Pacífico, encontra-se a cidade de Vicam, habitada em sua maioria por índios yaquis. Vicam é o local onde pela primeira vez encontrei Don Juan. Perto de lá obtive os ensinamentos.

 VEJA - Para não tirar a liberdade de Don Juan, até hoje o senhor não havia revelado este local. Como agora se sente livre em descrevê-lo com exatidão?
 
CASTANEDA - Porque agora ninguém conseguiria achar Don Juan; ele não está mais por lá, e Don Genaro também sumiu das montanhas do México Central (Sierra Madre Ocidental). Não existe jeito nenhum de encontrá-los. Don Juan me mostrou e ensinou tudo o que ele podia e por isso não há necessidade de que ele permaneça à minha disposição. Da mesma forma, você sabe que se quiser me encontrar é só ir até a UCLA, deixar um recado ou me procurar na biblioteca de pesquisas. Mas, se eu deixar de vir à UCLA, você não terá a mínima ideia de onde me encontrar. Como Don Juan, procuro viver como feiticeiro.

 VEJA - Muitas pessoas, eu inclusive, encontram dificuldades em aceitar factualmente as descrições dos ensinamentos de Don Juan. O senhor se preocupa com o fato de as pessoas reagirem dessa forma?
 
CASTANEDA - Não, porque não dou ênfase na importância de minha pessoa, este é um ponto crucial dos ensinamentos que recebi de Don Juan. Raramente converso com alguém, e quando converso é face a face. Nada de gravadores ou fotografias, que trariam peso sobre a minha pessoa. Além de ferir uma das premissas básicas de feitiçaria e bruxaria, eu estaria tolhendo minha própria liberdade. Quando enfatizo a minha pessoa, estou me tachando a mim mesmo, estou colocando nas minhas costas um peso que vai além das minhas possibilidades de carregá-lo. Colocar tal peso nas costas é dar uma enorme importância à minha própria pessoa. Durante os ensinamentos, Don Juan fazia esboços na areia do deserto com o dedão do pé e preenchia os círculos com verbosidade. Ele dizia que "cargase a uno mismo" conduz a pessoa a um senso "importância personal" que combinados não permitem "acciones" por parte da pessoa. Quanto mais peso as pessoas acumulam, mais importantes elas se sentem, e menos ações elas executam.

 VEJA - Por que então publicou seus livros?
 
CASTANEDA - Porque esta era a minha tarefa. O bruxo cumpre tarefas que são colocadas em lugar do peso sobre si mesmo e da importância pessoal. Meu trabalho não é feito de erudição, mas uma recoleção da vida que Don Juan colocou em seus ensinamentos. O bruxo cumpre as tarefas que lhe dão com satisfação. Ele as cumpre sem esperar por reconhecimento da sociedade ou coisa que o valha, o que seria o "carregar-se a si mesmo" exercitado pelo erudito, com o objetivo de obter importância pessoal, o que não é meu caso. Por exemplo, se esta entrevista for tomada como um ato de bruxaria, ela se torna uma tarefa a ser cumprida.
 
VEJA - Esta entrevista, seu trabalho, sua obra, e mesmo o fato de trocarmos idéias por várias horas, tem um efeito que me parece ir além do simples cumprimento de tarefas. Elas lhe trazem satisfação, caso contrário não as faria. Além do mais, o senhor espera que sua mensagem, os ensinamentos de Don Juan, tenham um impacto sobre público. Não seria este o caso de cumprir tarefas e esperar pelo reconhecimento da sociedade?
 
CASTANEDA - Eu cumpro minhas tarefas tão fluidamente que elas não me afetam em termos de auto-importância, mas sim em termos de como vivo minha vida. Conheço dúzias de "professores" que se colocam numa torre de marfim de conhecimento: eles sabem tudo, e comandam o espetáculo para as galerias; quanto mais aclamados, ou quanto mais reconhecimento eles recebem, mais auto-importantes se sentem, mas esta mesma auto-importância se torna peso, a cruz a ser carregada, e eles como pessoas não são nada. O trabalho as afeta em termos de auto-importância, mas não em termos de vida pessoal. A mim o trabalho afeta em termos de vida pessoal, mas não de auto-importância. Don Juan me alertou e aconselhou que nunca me tornasse um pavão, "pavo real", que é o resultado à ênfase da importância pessoal. Quanto menos a pessoa pensa e "pseudo-age" em termos de auto-importância ela se torna mais completa. E quanto mais auto-importante se sente, mais incompleta se torna. O ser incompleto nasce da incessante procura por reconhecimento social.
 
VEJA - Mas se a pessoa age, não estaria automaticamente à procura de auto-reconhecimento?
 
CASTANEDA - Não, se estiver agindo como um bruxo. O bruxo vive a vida por si e para si e não para as galerias. Ele não se deixa influenciar pelas reações de consenso social, pois não age em termos de auto-importância. Ele sabe "parar o mundo", ou melhor, ele tem a capacidade de "não fazer".

O "mundo parado", por um passe de mágica.
 
VEJA - E que significa "fazer, "não fazer" e "parar o mundo"?
 
CASTANEDA - O objetivo final do bruxo é se tornar um "homem de conhecimento, mas antes ele tem que aprender a viver como um guerreiro-pirata. Ele tem que ser um impecável caçador à procura de coragem e disciplina. O guerreiro-pirata age por si mesmo, e assume a responsabilidade por suas ações. No processo de me tornar guerreiro-pirata eu encontrei poder pessoal, isto é, o poder da coragem e disciplina. Don Juan me ensinou a enxergar, ver o mundo ao invés de simplesmente olhar. Ele ensinou-me a interpretar o mundo não pelo que se apresenta na superfície, mas pela essência. Porém, antes poder enxergar e interpretar o mundo como um guerreiro-pirata, como um bruxo, tive que aprender como "não fazer", como "parar o mundo". Como você pode notar, é quase que uma taxinomia de tarefas. Para se ter o entendimento de "não fazer" é necessário explicar o significado de "fazer". "Fazer" é o consenso que torna o mundo existente. O mundo da nossa realidade é realidade porque estamos envolvidos no "fazer" dessa realidade. As pessoas nascem com uma auréola de força, poder, que se desenvolve e se entrelaça com o consenso dominante. As pessoas olham o mundo da forma como lhe foi ditada, com os olhos do consenso dominante. Por outro lado, "não fazer" é possível quando uma auréola extra de poder se desenvolve para formar a existência da realidade de um outro mundo. O guerreiro-pirata não escapa do "fazer" do mundo, mas luta dentro desta realidade, a realidade do consenso dominante, o que o auxilia na criação da auréola extra de poder. O ato de "não fazer" conduz ao "parar o mundo", que é o primeiro passo para "enxergar". O mundo da realidade ordinária, do dia-a-dia, nos parece do jeito que é por causa do consenso social. "Parar o mundo" significa interromper a corrente comum de interpretação do mundo, do consenso dominante, ou em outras palavras, parar o consenso é enxergar o mundo como bruxo, numa realidade não-ordinária. "Parar o mundo" é viver num espaço temporal mágico, enquanto que viver na realidade do consenso é viver num espaço temporal ordinário.
 
VEJA - Um bruxo é um pragmático, e o senhor mesmo se rotula assim. Qual seria a aplicação prática de "fazer", "não fazer" e "parar o mundo"?
 
CASTANEDA - Você fuma desbragadamente, como um desesperado. Eu fumava como você, e cheguei a fumar quatro maços de cigarros por dia, até que Don Juan sugeriu que eu usasse a minha compulsão para parar de fumar. Eu deveria ficar envolvido no "não fazer" de fumar. Para isso eu teria que observar o fazer de fumar. Comecei então a observar o "fazer" de levantar pela manhã e procurar imediatamente meus cigarros, o "fazer" de colocá-los no bolso, o "fazer" de apalpar o bolso da minha camisa com minha mão esquerda para ter certeza de que os cigarros lá estavam. O lugar do cigarro, o fumar de dois deles no caminho da universidade, e assim por diante, constituíam o meu "fazer" de fumar. Como eu, você pode observar o que constitui o seu "fazer" de fumar. Uma medida sistemática de fazer leva a pessoa a não executar os detalhes do ato de fumar. Para "parar o mundo" de fumar a pessoa tem que aprender a compulsivamente dizer não para o "fazer" de fumar.1 Este exemplo é grosseiramente uma aplicação dos ensinamentos, pois eu parei de fumar logo nos primeiros contatos com Don Juan, mas somente consegui "parar o mundo" da realidade ordinária depois de dez anos. A partir deste ponto Don Juan deixou de usar plantas alucinógenas como parte dos ensinamentos.

Guias para se acabar com o bom senso
 
VEJA - O senhor não fuma, não bebe e evita até café. Como então vê o uso de drogas como parte dos ensinamentos de Don Juan?
 
CASTANEDA - Don Juan usou psicotrópicos e plantas alucinógenas como um auxílio aos ensinamentos. Uma vez atingido o objetivo, estes veículos se tornaram desnecessários. As drogas são maléficas para o corpo, e não tem nenhum defeito além de uma certa qualidade que o bruxo necessita.

 VEJA - De que modo as drogas serviam de instrumento auxiliar aos ensinamentos de Don Juan?
 
CASTANEDA - O mundo como nós o vemos é apenas uma descrição, e cada item da descrição é uma unidade, o que eu chamo de "gloss" (aparência externa") Uma árvore é um gloss, um quarto ou uma sala são glosses. Nós colocamos significado ao gloss-quarto como sendo a reunião de pequenos glosses - cama, cadeira, camiseira, armário. A realidade do consenso é formada por uma corrente infinita de glosses, os quais, por sua vez são formados e interligados por pequenos glosses. Esta corrente forma, na nossa realidade, um sentido comum, isto é, esta corrente de glosses tem que fluir em uma direção pré-concebida que nós chamamos consenso ou sentido comum. Para quebrar ou interromper a corrente, o bruxo usa drogas que criam um espaço vazio na corrente, implantando uma nova direção, a direção do sentido comum ou do bom senso da realidade não ordinária (realidade da bruxaria). Sentido comum e bom senso estão diretamente ligados ao nosso corpo. Com o uso de drogas, há uma interrupção no bom senso e abertura de uma nova direção, e essa nova direção só pode ser encontrada com um guia (bruxo), pois de outra forma o uso de tais drogas é sem valor. O homem geralmente tem a ideia de gozar a vida através dos vícios. Um viciado é uma criança profissional. Interromper a corrente de glosses, parar o mundo, com o uso de drogas só pelo prazer de interromper, só pode causar dano, além de ser uma brincadeira cujo preço é caro. Uma vez que o corpo aprendeu a interromper a corrente, não há mais necessidade de auxílio para tal interrupção. A pessoa interrompe pela própria vontade.

Uma estranha psicoterapia: sentir-se morto
 
VEJA - Acha que o processo de interrupção voluntária da corrente do "bom senso" seria eficaz se aplicado à psicoterapia?
 
CASTANEDA - O sucesso de Don Juan como psicoterapeuta é impressionante. Ele me fez cônscio de que eu era uma criança profissional, que eu estava colocando muito peso sobre mim mesmo, enfatizando minha importância de pessoal, e não transformando em ações minhas fantasias. Ele me ensinou a viver para o agora, a encarar a minha morte como um fato inevitável e existente em minha vida. O conceito de morte deve ser encarado como uma realidade. Don Juan me ensinou que, se eu me considerasse como morto, nenhuma das minhas ações teria importância pessoal, e com isso eu poderia mudar, ou mudanças poderiam ser feitas e tarefas serem cumpridas. O fato inevitável de morte é muito mórbido para o homem ocidental, e em conseqüência o Ocidente procura interação social com o objetivo de ajustamento ao "bom senso".
 
VEJA - Seria correto dizer que a pessoa, em nossa realidade rotulada de psicótica, para Don Juan seria apenas a pessoa que acidentalmente interrompeu a corrente do "bom senso" e não conseguiu refazer esta corrente?

CASTANEDA - Correto. O bruxo quebra a corrente do bom senso por vontade própria. não é uma coisa acidental. Nas primeiras experiências tenho quase certeza que sem um guia teria perdido o contato com a realidade do consenso; em outras palavras, eu não seria capaz de encontrar o caminho de volta a essa realidade. O guia orienta o aprendiz a sair da realidade do consenso e a entrar na estranha realidade da bruxaria, bem como sair daquela estranha realidade e voltar a realidade do consenso. Este exercício é repetido até que o aprendiz adquira o domínio da sua própria vontade. Para o psicótico, o exercício sobre a direção de um psicólogo clínico ou de um psiquiatra resume-se a retornar à realidade do consenso, e a permanecer conformado. O bruxo, além de guia, é o modelo de "homem do conhecimento". Para Don Juan, qualquer mudança somente é possível se a pessoa praticar seus próprios ensinamentos. Novamente a filosofia "eu faço o que eu digo" prevalece.

 
VEJA - "Porta para o Infinito" menciona o uso de sonhos como um exercício no domínio e controle da própria vontade. Seria este controle da mesma natureza do domínio da própria vontade ao que o senhor acaba de se referir?

CASTANEDA - Eu menciono neste livro os diversos exercícios para controle dos sonhos, ou seja, para que a pessoa possa colocar os sonhos a seu serviço e sonhar produtivamente. Este sonhos requerem o mesmo domínio da vontade que é necessário para sair e voltar à realidade ordinária. Sonhos para um bruxo não são simbólicos, mas frutos do controle que adquire através dos ensinamentos. Ele dorme sonhando sonhos produtivos, como que uma continuação do dia a dia, ao invés de sonhar sonhos ordinários comuns, e sem controle. Aos poucos, uma pessoa consegue se disciplinar, a ponto de, sonhando, ser capaz de ver a sua própria imagem dormindo a sonhar. O caso extremo deste controle pode ser exemplificado pelo que Don Genaro afirma ser capaz - materialização de uma duplicata da sua própria pessoa. Com o controle dos sonhos a pessoa pode aumentar a sua capacidade de ação. Todas essas realidades não exploráveis da realidade do consenso formam um todo - o "homem de conhecimento".

 
VEJA - O senhor acha que nós exploramos e usamos apenas parcialmente o nosso potencial por razões inerentes à nossa educação formal?
 
CASTANEDA - A educação formal e informal do homem ocidental não dá margem a nada estranho ou diferente do consenso social. O que é fora da norma do nosso bom senso é considerado anormalidade. Também falta ênfase na noção de responsabilidade para consigo mesmo: não falamos suficientemente da responsabilidade para as nossas crianças, e por esta razão poucos deixam de ser crianças, e vivem a vida como crianças-profissionais. Explicando melhor: a criança profissional é a pessoa que precisa de carinho e é recompensada por meio de atenção dispensada a sua pessoa. Ela é auto.importante, um eterno infant terrible. Queria deixar de uma vez por todas de ser criança, mas eu era muito querido por mim mesmo, e sempre tinha uma desculpa para que continuasse alimentando minha auto-importância. Não fazia nada, não produzia nada, ações eram abafadas pelos meus planos e decisões, e pelo meu senso de importância pessoal. Até que aprendi com Don Juan a deixar de ser criança profissional e me tornei guerreiro-pirata.. Ficar sentado, esperando que me dessem tudo ou sonhando acordado com a glória da minha auto-importância, não me trouxe nada. Eu tive que ir procurar coragem e disciplina.
 
De criança profissional a guerreiro-pirata
 
VEJA - O senhor vive como um bruxo, isto é, uma vida de anonimato, enquanto o seu trabalho é público e de muito sucesso. Qual é a satisfação pessoal que resulta deste aparente antagonismo entre autor e pessoa?
 
CASTANEDA - Minha satisfação vem de escrever impecavelmente e de apresentar minha pessoa à luz da verdade. Eu realmente não vejo antagonismo, pois minha vida pessoal é um reflexo da minha obra. Novamente afirmo que faço aquilo que digo, pratico aquilo que prego. E uma vez que sou honesto comigo mesmo, não me importa o que e como a galeria pensa ou reage. Desta forma, sou livre dos altos e baixos. Veja o exemplo de Timothy Leary, o guru do ácido lisérgico. Ele é um exemplo típico de excesso de auto-importância. Lá pelas tantas o peso se tornou demasiado e ele teve que pagar o preço extremo. Muitos são os escritores que pregam mas não seguem a própria pregação, muitas são as pessoas que promovem um corpo forte e uma mente sadia, mas acabam destruindo gradativamente o próprio corpo e mente. Don Juan era o modelo que fazia e praticava tudo aquilo que era colocado como tarefa para mim, durante todos os anos da aprendizagem.
 
VEJA - O senhor mencionou o modelo de Don Juan, mas foi também exposto a um outro modelo: o consenso social. Como alia esses modelos em sua vida?
 
CASTANEDA - O modelo de Don Juan me deu os parâmetros de uma realidade diferente da do consenso social. Outro modelo me conduzia ao eterno enfant terrible. Ao longo dos ensinamentos, abandonei este último. Um modelo me conduzia à criança profissional, e outro ao verdadeiro guerreiro-pirata. Quando a pessoa tira o senso de auto-importância do seu caminho e toma a consciência de que o homem que puxa a corda e trama os pauzinhos é tão humano quanto eu ou você, ela pode atingir aquilo que quiser. A pessoa pode ser ultra-inteligente e cheia de recursos, mas se somente espera que as coisas lhe venham às mãos, quando não é atendida pelo mundo cai num estado de ódio, remorso e medo. O guerreiro-pirata não tem medo, ele não espera que as coisas venham até ele. Ele age, cumpre suas tarefas, e ao mesmo tempo não se preocupa com as conseqüências.
 
Notas

1Em uma entrevista mais recente, concedida a Carmina Fort, Castaneda relata que Don Juan, para fazê-lo parar de fumar, certa vez levou ao deserto, avisando que iam passar lá vários dias. Castaneda fez um estoque de cigarros, com várias caixas embrulhadas. Enquanto dormiam, os cigarros sumiram. Castaneda, desesperado, procurava uma explicação. Don Juan disse que talvez tivesse sido os lobos. Rondaram as habitações próximas mas não acharam nada para Castaneda fumar. Esse acontecimento foi decisivo para ele largar o mau-hábito (nota do redator).

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