domingo, 10 de dezembro de 2023

Não há explicação ou arcano zero


Há vezes em que a única explicação é esta:

Não há explicação.

E não ter explicação é apavorante.

Acho que o homem forjou a razão pelo medo diante do universo e de sua imprevisibilidade. E assim surgiu a religião, a mitologia, a filosofia, a ciência e a psicanálise. Sim, a religião é um esforço racional, um esforço por explicar e entender, uma teoria sobre a realidade assim como a teoria do big bang.

O mistério é muito apavorante.

Tão apavorante que mesmo Einstein diante da mecânica quântica não quis admitir e disse: Deus não joga dados.

A razão não passa de uma tentativa desesperada de explicar o inexplicável. Ela aplaca nosso medo disfarçado de curiosidade.

Ela cria a ilusão de que o entendimento é um processo que caminha para uma realização total, como a teoria de tudo, o entendimento da mente divina almejado por Einstein.

Dizem que Deus “é uma expressão de anseio pelo pai todo-poderoso, que cuidará de nós”.

A razão tornou-se um substituto para Deus.

A razão tornou-se um tirano que quer a tudo explicar, é o deus, reflexo de nossa autoimportância diante do Infinito. É o racional tentando sobrepor-se ao mistério, um jogo de dominação que entra na questão do masculino e do feminino.

Mas assim como não há ninguém para cuidar de nós também não há ninguém que possa nos explicar o mistério e o caos do Universo.

Tantas teorias, metafísicas, doutrinas, filosofias para quê? Um vasto menu que nunca satisfaz o cliente.

Mas aí entra a razão, que como a religião, não passa de um consolo, quando se crê que para tudo há uma razão de ser.

Porque nos é tão difícil aceitar que não há uma razão para tudo que acontece em nossas vidas?

Carma? Culpa? Pecado? Missão? Cuidado com tudo aquilo que te prende a um pretenso passado...há uma sombra que ronda e da qual pululam tais conceitos. Cuidado com tudo aquilo que quer te vincular a um futuro: Apocalipses, Profecias, Previsões. Se for para se prender que seja a isto: o aqui e o agora.

Você se ri? Então abrace o martelo: 

"Que importa que eu venha a ter razão? Eu tenho razão demais. — E quem hoje ri melhor também ri por último¹".

Pois é tudo o que vale para quem está vivo: aqui e agora, o preciso momento.

Sem o apoio de um deus e de uma razão que é do homem? Algo tão vasto que dá medo? Ou algo tão primitivo que não vale a pena? Ou apenas um bicho, como outro qualquer?

Nós que nos dizemos um animal intelectual não percebemos o que o intelecto é apenas um recurso de sobrevivência e um recurso que tem feito muito mais dano do que bem a nós mesmos. Tem nos levado a um mar de confusão e teorias onde acabamos enredados nos pensamentos, como se fôssemos uma presa de algo em nós mesmos, como se a mente fosse o labirinto de Creta.

Penso, logo existo? Mas quem pensa? Quem eu sou?

Há uma virtude na razão quando ela reconhece seus limites, mas quando ela vai além de si torna-se neurose, às vezes aneurisma, e aquém é apenas burrice.

Nunca ouvi uma frase mais insensata do que esta: seja realista!

Há algo em nós capaz de saber além de toda e qualquer explicação?

Surge uma das frases de Matrix: Não pense que é, saiba que é.

A razão se faz perfeitamente racional (desculpem a redundância justificada pelo ênfase necessária) quando se depara com os seus limites e descobre a humildade.

DR

Notas

¹ Friedrich Nietzche, Crepúsculo dos Ídolos, aforismo 43.

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