terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Sobre a vaidade



Diferente da noção de pecado da religião cristã o Xamanismo Guerreiro (X.G.) compreende a vaidade como um paradoxo, como um centro de onde surge tanto o positivo quanto o negativo quando se trata de alcançar o núcleo daquilo que nos define.

Talvez a grande diferença para o X.G. está no fato de seus praticantes operarem com uma vaidade que não necessita de aprovação do outro, de reconhecimento social ou de qualquer impulso exterior para tornar-se um elemento de realização pessoal.

Para o Xamanismo Guerreiro a vaidade não é pecado, é uma energia de ordem emocional que precisa ser direcionada não por normas morais e sociais, mas para o propósito abstrato de desenvolver todo o potencial humano.

Assim há para o XG uma vaidade que nos serve e há uma vaidade imprestável. Nossa tarefa é desnatar uma da outra. Mas ela não são duas vaidades, dois tipos de vaidade, há uma vaidade apenas que precisa ser direcionada não para atender aos ditames da ordem social mas para alcançar o intento da liberdade de ser.

"— A vaidade não é algo simples e ingênuo — explicou. — De um lado, é o núcleo de tudo que é bom em nós e, por outro, o núcleo de tudo que não presta. Livrar-se da vaidade que não presta requer prodígios de estratégia. Através dos tempos, os videntes renderam homenagens àqueles que conseguiram" - O Fogo Interior, de Carlos Castaneda (← download no hiperlink).

Essa vaidade que presta talvez surja de uma satisfação pessoal, de uma realização interior, de uma felicidade que brota do guerreiro ou da guerreira quando segue aquilo que o nagual Juan Matus chamou de "o caminho do coração" sem que haja a necessidade ou a carência de um carimbo sociocultural.

Sobre a vaidade imprestável

A maior dificuldade que enfrentamos ao informar as pessoas que elas estão sendo enganadas é a vaidade, pois ninguém quer acreditar que foi enganado por tanto tempo sem perceber que estava sendo.

A maior prova disto é quando a informação revelada se dá no âmbito das relações cotidianas, pois ninguém quer acreditar que o outro, que é como você, mais um na multidão, está de posse de um conhecimento desse nível, então você acaba por ser taxado de teórico da conspiração ou paranoico de plantão. Mesmo que as informações sejam passadas com clareza, lógica e evidências o aparente ceticismo está cimentado numa vaidade tão estruturada que é muito difícil a pessoa ceder diante de argumentos mesmo cabais.

Assim uma definição possível de vaidade é o culto do reflexo das próprias crenças.

Fanatismo, ceticismo, estupidez e paranoia são apenas variações conceituais da mesma vaidade.

O principal objeto de culto dessa vaidade chama-se TV, que se tornou uma projeção na mente da maioria das pessoas. Ainda há tempo, desligue-a. A gente se vê por aqui, ou por aí.

Contudo, a informação pura e simples, mesmo embasada em dados reais não é suficiente para amparar novas decisões, pois estas não são tomadas no nível puramente racional, precisam atingir camadas mais profundas da psique. Sabedores disso alguns, desde o início do século passado, amparado nas teorias de Freud, resolveram utilizar tal informação para simplesmente manipular as pessoas em seus pontos mais fracos: vaidade, luxúria e medo.

Assim uma mulher pode ter mais de 40 pares de sapato, um homem ter um potente Porsche para trafegar no trânsito de Sampa e um humilde trabalhador pode torcer por seu time de jogadores milionários simplesmente porque isso os faz se sentirem do jeito que a propaganda lhes sugeriu, mesmo que seja absolutamente desnecessário e até mesmo completamente absurdo.

O consumismo não é o consumo de coisas, mas sim de emoções.

Assim nós, as pessoas, nos tornamos produtos que consomem produtos para satisfazer desejos e emoções artificialmente induzidas. Por exemplo: a emoção propiciada pela certeza e pelo senso comum nos dá uma sensação de (pseudo)segurança e dizemos em alto e bom som: - Teoria da conspiração! E assim seguimos um comando sintático, um clichê produzido pelo sistema dominante. Consumimos a produção intelectual do sistema sem nos darmos conta. Nos acreditamos bem informados quando somos apenas bem domesticados.

Vaidade, vanitas, vanus, vazio, futilidade, ilusório são palavras interligados ao consumismo atual, onde consumimos a nós mesmos por nada, esquecendo do segundo princípio da espreita de si: eliminar tudo aquilo que é supérfluo em nossa vida, fazendo-a convergir assim para o propósito maior: a liberdade de perceber.

Como diz o diabo de Al Pacino no filme Advogado do Diabo: a vaidade é o meu pecado predileto.

A sorte é que alguns de nós estamos conscientes, em certo nível, de nossa própria vaidade. E podemos rir dela.

DR



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