quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Caminhos da Terra - 3ª parte


Ampliando o tema.

O ramo do Xamanismo que estudo e sei que o mesmo ocorria em muitas das chamadas escolas de mistérios na Grécia antiga e no Egito, Índia e China levam vc a viver o que está estudando.

O conceito de estudar e aprender algo no Xamanismo e em tais escolas é diferente da abordagem hoje existente no ocidente.

Hoje se trabalha com idéias, com palavras, com textos, com informações.

Quando falamos que a iniciação é de boca para ouvido, podemos, equivocadamente pensar, que seja a transmissão de conhecimentos verbais.

Nada mais distante.

No Xamanismo, nos ramos de Magia e em algumas escolas que conheço quem lhe inicia cria condições, cria o "cenário" no qual vc vai presenciar diretamente o tema que está estudando. Um (a) iniciador é alguém que já vivenciou o tema estudado e agora vai te expor ao mesmo tema.

Para nós aprender Magia por livros seria tão "sensato" como aprender a nadar no mar, via curso de correspondência. Como dificilmente o autor do curso vai receber uma carta do "afogado" avisando das falhas do método, pode até acreditar e fazer outros crerem que funciona, mas nada mais distante da realidade.

O problema é que tem muita gente presa na visão moralista da evolução.

Evoluir é ser bom, é ser "santo" e por aí vaí. Mas eu gosto mais de uma definição que ouvi alhures:

"Evoluir é transformar vida-energia em vida-consciência".

Tem riscos, é um caminho árduo e trabalhoso. Como chamei a atenção em outro mail, parece que muitos esqueceram completamente que as antigas escolas de sabedoria tinham (e ainda têm) testes iniciáticos, provas, para testar a têmpera de quem se propõe a trilhar tais caminhos. Nada mais distante da realidade que essa idéia que o "esoterismo é para todos (as) e que "basta ter boa vontade".

Nem os cristãos com toda sua pataquada falam isso, ou se esquecem do "muitos os chamados, poucos os escolhidos" e da "porta estreita"? Não se trata de uma eliminação do esoterismo, é outra coisa, é a percepção clara que um caminho precisa de base para ser trilhado e se não nos propusermos a gerar esta base em nós, vamos ficar sempre na periferia do esoterismo ou pior, caindo nestas pseudo escolas e pseudo linhagens que tem muita fantasia e "frisson", mas pouco agem em relação a profunda e avassaladora transformação que nos permite abandonar o que fizeram de nós e ir em busca da autoconstrução.

Um sheik que conheci dizia: O CAMINHO deve ser algo decepcionante quando encontrado, algo assustador no princípio, pois se corresponde exatamente ao que se busca só pode ser falso, pois quem busca? A falsa personalidade, com todas suas angústias e carências. Assim uma certa perplexidade sempre toma aquele (a) que se defronta com o CAMINHO, perplexidade que logo se desvanecerá a medida que caminhante e caminho se tornarem mais e mais unos".

O sábio Yaqui D. Juan Matus também afirmava que o "benfeitor" logra o aprendiz, fazendo-o crer que o importante é algo sem valor, mas que lhe é posto a frente, enquanto o verdadeiro Trabalho está sendo feito. Assim de nada adianta ficar lendo sobre elementais, o valor está em vivenciá-los, na prática.

Não que a leitura seja sem valor, ao contrário, a leitura pode te alimentar com a experiência acumulada de gerações de magistas e evitar que erros sejam cometidos, mas vc só poderá dizer que compreendeu o tema dos elementais quando conviver com eles, quando operar no mundo dos mesmos e for além das formas fantasiosas que eles adotam para quem ainda está começando na arte.

A Magia é um campo infinito, amplo e em expansão e como seria diferente se vivemos num universo amplo e em expansão e tão vasto que para nossos referenciais o termo infinito é o único que se adequa a qualquer mensuração?

Há muitas armadilhas que podem desviar alguém do Caminho, que podem nos deixar presos a um detalhe quando a totalidade nos espera. Há uma analogia interessante. Nosso estado normal de vida é estar preso a um quarto de uma vasta casa. A Magia nos revela que há uma porta. Há outros quartos, há uma cozinha, uma sala, alguns chegam até a sala onde a lareira está acesa e o frio do quarto pode ser esquecido. Mas o que poucos percebem é que, fascinados com a imensidão da casa, apenas ampliaram sua prisão, agora não mais presos no quarto estão, mas continuam presos na casa.

A tradição mágica profunda tem aí seu valor. Nos ensina a encontrar a janela, ou a porta da rua, que nos permitirá não apenas sair de um quarto para ficar preso noutro, por mais confortável e agradável que o novo quarto ou sala possa parecer, mas nos ensina como escapar definitivamente da casa, audaciosamente indo além do humano, além dos limites.

Para os magistas com os quais estudo esta é a maior armadilha dos praticantes modernos, a mesma que em outros tempos tantos caíram. Após ficarem presos por tanto tempo em escuro e apertado quarto, o fascínio de encontrar um corredor, outros quartos, outras dependências é muito forte e passaram a chamar esses outros cômodos de "plano espiritual", "níveis mais elevados", crendo que apenas se deslocar para estes outros "cômodos da casa" era "evolução", era "espiritualizar-se".

Mas o desafio profundo continua, fora da casa, nos esperando, esperando aos (às) poucos(as) que tem a coragem para ir além e abandonar as armadilhas antropomorfizadas que é o legado que nos prende por eons e realmente prosseguir na aventura da evolução, indo além dos mundos humanos ou dos deuses.

Assim os magistas que tenho partilhado vivências consideram que no princípio é um caminho válido treinar nos outros quartos, podemos encontrar roupas mais quentes para enfrentar o clima inóspito de fora da casa, podemos encontrar mantimentos na dispensa que nos sustentarão até aprendermos a conseguir nosso próprio alimento fora da casa, enfim podemos ir aos outros cômodos da casa como treino, como desenvolvimento, mas nunca nos prendermos e nos limitarmos a eles.

Assim, visitar os mundos que nos cercam, as várias realidades que nos interpenetram, tudo isso tem valor de treino. Mas o verdadeiro mistério da morte não pode ser assim resolvido, esta iniciação é final, é plena e a verdadeira partida é sem volta. Antes disso estaremos apenas nos limites do conhecido, quer o percebamos ou não.

A verdadeira morte ainda não ocorreu e não resta dúvida que muitos são capazes de continuar vivos depois da morte, quando são vivos na vida, pois que estranha mania essa de considerar que morrer dá vida e identidade a quem nunca teve isso, a quem passou pela vida como autômato, como extensão biológica de máquinas e sistemas. Me lembro quando, ainda espírita, tive meu primeiro contato com estas concepções. Fiquei revoltado, pois tinha forte a idéia de "justiça cósmica", um "deus justo que ajuda seus filhos" e outros conceitos profundamente imaturos. Rindo, uma psiquiatra que me iniciou em certa linhagem rosa-cruz comentou comigo quando lhe expus minha perplexidade:

"Enquanto não estiver pronto para abandonar estes brinquedos não estará pronto para amadurecer".

Hoje entendo o que ela quis dizer. O problema é que buscamos conforto em muitas explicações e a Eternidade é vasta demais, ampla demais, o Caos envolve o Cosmos e precisamos ser fortes e corajosos para realmente ir mais longe que as "visões consoladoras".
Nuvem que passa

4 comentários:

Unknown disse...

Boa,sou novo por aqui,queria te pedir uma coisa, se voce fosse indicar uma escola, pra alguem que se indentifica com os livros do Castaneda e com o Budismo,pelo menos pra conhecer qual voce indicaria?

Fridu Nanthjan disse...

Boa noite, Iacob!

No Rio de Janeiro eu participei do Instituto Gurdjieff. O ensinamento de Gurdjieff começa pela observação de si mesmo, conceito que se corresponde com o "espreitar a si mesmo" que encontramos no conhecimento do nagual. É um excelente primeiro passo. Curiosamente, dentro do Instituto Gurdjieff, no Rio de Janeiro, havia (e ainda deve haver) uma estátua do Buda, o que simbolicamente sempre indicou para mim uma harmonia entre o ensinamento de Gurdjieff e do Buda, pois tais mestres estavam essencialmente preocupados com a questão espiritual através do despertar da consciência humana, através de um trabalho sobre si e através de um grupo, com base pragmática e com um fundamento racional, crítico, que dispensa a crença pela crença.

Na coluna da direita do blog, em aliados, vc encontra o link do Instituto.

No intento,

F.A.

Djaysel Pessoa disse...

após ler o texto... acabei escrevendo tb... se interessar.... www.zzurto.blogspot.com


abraço fraterno...

dilenia disse...

Que maraviha! faz muito tempo que não encontro um artigo que fale com tanta claridade, aí esta justamente tudo o que sinto.Faz muitíssimos anos, presisamente la por 1975 que comecei a ler as obras de Castaneda, desde esse momento começou minha procura pela "pistas do caminho", percorri muitos senderos, muitas escolas, muitos religiões e é exatamente como diz Nuvem que Passa:"Mas o que poucos percebem é que, fascinados com a imensidão da casa, apenas ampliaram sua prisão, agora não mais presos no quarto estão, mas continuam presos na casa." assim me sinto, como se tivesse dado voltas em circulos, nesse momento sinto-me perdida no "intento". Aprendi muitos coisas en todo esses anos, e estou agradecida por cada lugar por onde passei, mas é como se estivesse chegado a um bêco sem sida e a única coisa que me resta é esperar que algo suceda. Obrigada e disculpa o desabafo.

Caminhos da Terra - 3ª parte

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