A inveja é alegria e tristeza ao mesmo tempo, alegria pela tristeza do outro e tristeza pela alegria do próximo, é o pecado oculto, ninguém o admite e isto ocorre por que há um outro pecado que esconde a inveja. A inveja como pecado é tão humilhante, mais tão humilhante que seu sujeito não quer se ver e faz tudo para não se ver, e isto mesmo é a inveja, in_veja, um não ver. Ninguém que ver em si algo tão dilacerante para um outro pecado, pecado capital: o orgulho. É o orgulho que não pode admitir a inveja, pois este reconhecimento implica em olhar a nossa derrota, a nossa inferioridade, a nossa incapacidade. O orgulhoso só quer sair sempre vitorioso e ter a última palavra. O invejoso quer ver apenas a derrocada do outro, mas não a própria, por isto Dante Alighieri apresentou o invejoso com os olhos costurados por arame em seu Purgatório.
Naturalmente, a inveja é um pecado óbice para aqueles que buscam se auto-conhecer, pois nos impede de ver a nós mesmos, assim como a ira que cega e o orgulho que ofusca, a inveja nos impede de ver antes de tudo a nossa própria singularidade, pois sobrevive apenas num desejo de comparação entre pessoas que não podem ser na verdade comparadas, pois todos somos únicos. Se reconheço em cada um a sua própria singularidade como a inveja pode subsistir? Mas vivemos numa sociedade que estimula a comparação constantemente apesar de sermos incomparáveis.
A inveja possui dois servos fiéis e usa destes dois servos fiéis para secretar o seu veneno, são servos poderosos e operam através da língua humana como se fossem dois demônios ou dois obsessores, para usar a linguagem mais moderna, a versão atualizada da palavra demônio: obsessor.
Se a inveja for vista como uma espada pontiaguda estes dois obsessores compõe a espada de duplo fio da inveja: a crítica e a fofoca.
A crítica e a fofoca compõe a assessoria de imprensa da inveja, uma assessoria de bastidores e esgotos.
Reparem que tanto um como o outro seguem o mesmo estilo de sua senhora inveja, nunca se apresentam, sempre se dão pelas costas, as escondidas, agem de forma astuta, velada, secreta, de forma indireta pois não podem revelar a sua senhora sempre envolta em trevas, em cantos escuros e mentiras. Como o invejoso, o crítico da vida alheia e o fofoqueiro sempre realiza suas falas pelas costas daquele que é o objeto de sua língua ele revela uma outra qualidade terrível que o próprio Dante Alighieri coloca no último círculo dantesco. Imagine alguém que por trás fala mal e pela frente lhe trata bem, lhe cumprimenta abraça e até beija. Isto nos lembra Judas que traiu Jesus (terá traído mesmo? Dizem, e essa é fala fofoqueira por excelência, pois o fofoqueiro sutil coloca sempre o sujeito elíptico para encobrir a si mesmo, que Jesus a cruz rogou ao pai da seguinte forma: - Por que me abandonastes?) com um beijo e nos faz perguntar: quem não tem inveja?
Quem não tiver apresente-se, trata-se de uma raridade, tão rara que dá até para desconfiar.
Já a inveja é legião.
E horrorizados vemos aquilo que não consegue olhar com alegria pelo bem que o outro é.
E vemos que nos fizemos tal como somos pela própria inveja não admitida.
Porque admiti-la destrói o nosso ser no mundo, por isso está escondida de ti por trás da ira, da crítica , do sacrifício ou da falsa rebeldia, com seus rebentos disformes da reclamação, da fofoca e do despacho de língua ferina.
Inveja. Veja in, olhe dentro, expurgue-a pelo olhar compreensivo, na figa da auto-observação, pois cada qual possui um dom divino para benefício de todos.
Oh, auto-estima minada!
Ó mediocridade de si!
Ó maldita e mal-olhada, escondes em ti teu próprio bem.
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