quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Observação de si, atenção e pequenos hábitos

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A impecabilidade começa com um único ato, que tem de ser deliberado, preciso e fundamentado. Se esse ato é repetido pelo tempo suficiente, adquire-se o senso de um intento inflexível, que pode ser aplicado a qualquer outra coisa. Se isso é realizado, o caminho é claro. Uma coisa leva à outra até que o guerreiro perceba todo o seu potencial - Carlos Castaneda.


A observação de si é muito difícil. Quanto mais tentarem, mais perceberão isso. No momento, devem exercitar-se nela, não objetivando um resultado, mas para compreender que não podem se observar. Até agora imaginaram que se viam e se conheciam.

Estou falando de uma observação de si objetiva. Objetivamente, vocês não são capazes de se ver nem por um minuto, porque trata-se aí de uma função diferente: a função do amo (do ser).

Se acreditarem que podem observar-se por cinco minutos, isso é falso; seja vinte minutos ou um minuto, dá no mesmo. Se constatarem simplesmente que não podem observar-se, então terão razão. Sua meta é chegar a isso.

Para alcançar essa meta, devem tentar e tornar a tentar. Se tentarem o resultado não será a observação de si no sentido pleno da palavra. No entanto, o próprio fato de tentar fortificar a sua atenção. Aprenderão a se concentrar melhor. Tudo isso será útil a vocês mais tarde. Só mais tarde é que poderão começar a se lembrar verdadeiramente de si mesmos.

Hoje só dispõem de uma atenção parcial, proveniente, por exemplo, do corpo ou do sentimento.

Se trabalharem conscienciosamente, vocês se lembrarão de si mesmos e não mais, porém menos, porque a lembrança de si mesmo é cada vez mais exigente. Isto não é tão fácil, tão barato .

O exercício da observação de si é suficiente durante anos. Não tentem mais nada. Se trabalharem conscienciosamente, verão do que necessitam.

Pergunta : Como podemos adquirir atenção?

Resposta : Ninguém tem atenção. Sua meta deve ser adquiri-la. A observação de si só é possível depois que se adquire atenção. Comecem por pequenas coisas.

P.: Por quais coisas pequenas devemos começar? Que devemos fazer?

R.: A sua constante agitação nervosa faz os outros sentirem, consciente ou inconscientemente, que você não tem autoridade alguma e é um pobre coitado. Você não pode ser alguém mexendo-se continuamente como está fazendo sempre. A primeira coisa que você deve fazer é parar essa agitação. Faça disso a sua meta, o seu deus! Peça até mesmo a sua família que o ajude; depois disso, talvez possa adquirir atenção. Eis um exemplo do que significa fazer.

Outro exemplo: aquele que ambiciona se tornar pianista só poderá aprender aos poucos. Se você quiser executar melodias sem praticar antes, nunca poderá tocar verdadeiras melodias. O que vai tocar será uma cacofonia penosa de ouvir e que o fará ser destestado pelos outros. Ocorre o mesmo no domínio psicológico: para se adquirir algo é preciso uma longa prática.

Tente fazer primeiro coisas bem pequenas. Se você quiser começar de imediato por coisas grandes, nunca chegará a ser nada; as suas manifestações terão efeitos igualmente cacofônicos, que farão com que as pessoas o detestem.

P.: Que devo fazer?

R.: Há duas maneiras de fazer: uma por automatismo e a outra para alcançar uma meta. Escolha uma pequena coisa que não é capaz de fazer e faça dela a sua meta, o seu deus. Não deixe que nada se interponha. Olhe só para isso. Então, se você conseguir isso, será possível para mim dar-lhe uma tarefa maior. Por ora, você tem olhos maiores que a barriga, aspira fazer coisas grandes demais e nunca as poderá fazer. É um apetite anormal que o desvia das pequenas coisas que você seria capaz de fazer. Destrua esse apetite, esqueça-se das coisas grandes. Tome como meta vencer um pequeno hábito.

P.: Creio que falar demais é meu pior defeito. Seria uma boa tarefa não tentar falar tanto?

R.: Para você é uma meta muito boa. Você estraga tudo com a sua tagarelice, que prejudica inclusive seus negócios. Ao falar demais, as suas palavras não têm peso nenhum. Tente superar isso. Se conseguir, todas as espécies de benção fluirão para você. Sem dúvida, é uma meta muito boa, mas é uma coisa grande, não é uma coisa pequena. Eu lhe prometo que, se você conseguir isso, mesmo que eu não esteja aqui, eu vou sabê-lo e lhe mandarei ajuda, para que saiba o que deve fazer a seguir.

P.: Suportar as manifestações dos outros seria uma boa tarefa?

R.: Suportar as manifestações dos outros é uma coisa grande, talvez a maior para um homem. Só o homem realizado é capaz disso. Comece fixando como meta a capacidade de suportar uma manifestação de alguém que você não pode aguentar hoje sem se exasperar.

Se "quiser", "poderá". Sem querer, nunca poderá. Querer é a coisa mais poderosa do mundo. Com um querer consciente, tudo se consegue.

P.: Eu me lembro com frequência de minha meta, mas não tenho energia para fazer o que sinto que devo fazer.

R.: O homem não tem energia para atingir as metas que fixou para si, porque toda a sua força, acumulada durante a noite, durante o seu estado passivo, é desperdiçada em manifestações negativas, que são manifestações automáticas, ao contrário das manifestações positivas, voluntárias.

Para aqueles dentre vocês que já são capazes de se lembrar automaticamente de sua meta, mas que não tem força para realizá-la: sentem-se sozinhos durante uma hora pelo menos; relaxem todos os seus músculos. Deixem desenrolar suas associações mas sem deixar-se absorver-se por elas. Digam a elas: "Se me deixarem fazer agora o que quero, mais tarde lhes darei o que desejarem". Olhem para as suas associações como se fossem outra pessoa, para não se identificar com elas.

Ao cabo de uma hora, peguem uma folha de papel e escrevam nela sua meta. Façam desse papel o seu deus. Que fora dele nada exista. Tirem-no do bolso e leiam-no constantemente, todos os dias. Assim a meta se tornará parte de você mesmo; de início teoricamente, depois realmente.

Para adquirir energia, pratique o exercício que consiste em ficar sentado tranquilamente, com todos os músculos relaxados, como se estivessem mortos. Só quando estiver tudo calmo em você, depois de uma hora, é que tomará sua decisão. Não permita que as associações o absorvam. Fixar uma meta voluntária e alcançá-la gera magnetismo e capacidade de "fazer".

P.: Que é o magnetismo?

R.: Num grupo verdadeiro, se poderia dar uma resposta verdadeira a essa pergunta. Digamos que o homem tem em si duas substâncias: a substância dos elementos ativos do corpo físico e a substância proveniente dos elementos ativos da matéria astral.

Quando se combinam, essas duas substâncias formam uma terceira. Essa substância composta se concentra, por um lado em certas partes do homem e, por outro, forma uma atmosfera em torno dele, semelhante a atmosfera que envolve um planeta.

Sob a ação de outros planetas, a atmosfera de um planeta adquire ou perde continuamente substâncias. O homem está cercado de outros homens, do mesmo modo que os planetas estão cercado de outros planetas. Quando, dentro de certos limites, duas atmosferas se encontram e são "simpáticas", se estabelece entre elas uma relação que dá resultados de conformidade com as leis. Algo circula. A quantidade de atmosfera continua a mesma, mas a qualidade muda. O homem pode controlar a sua atmosfera.

É como a eletricidade: há o positivo e o negativo. Um ou outro pode ser aumentado e levado a fluir como uma corrente. Todas as coisas tem uma eletricidade positiva e negativa. No homem, os desejos e não-desejos podem ser positivos e negativos. A matéria astral se opõem sempre a matéria física. Nos tempos antigos, os sacerdotes eram capazes de curar as doenças através da benção . Alguns deles tinham que por suas mãos sobre os doentes, outros podiam curar a curta distância e outros à grande distância. Um sacerdote era um homem que tinha "substâncias compostas" e podia se servir delas para curar os outros. Um sacerdote era um "magnetizador". Os doentes carecem de "substâncias compostas", carecem de magnetismo, carecem de "vida".

Se estiverem concentradas, essas substâncias compostas podem ser vistas. Uma aura, um halo, é algo real e às vezes pode ser vista em lugares santos ou igrejas (ou locais de poder).

Mesmer descobriu o uso dessa substância. Para ser capaz de utiliza-la, é preciso primeiro adquiri-la.

O mesmo ocorre com a atenção.

Só se adquire atenção pelo trabalho consciente e pelo sofrimento voluntário, por pequenas ações realizadas conscientemente.

Faça de uma pequena meta o seu deus; isso o levará a adquirir magnetismo. O magnetismo, como a eletricidade, pode ser concentrado e transformado em corrente.

Em "Gurdjieff fala a seus alunos", págs. 94 à 98, Ed. Pensamento.

Um comentário:

Diego dos Santos disse...

Excelente texto!

Sagrado Feminino: Kali.

Justamente hoje (08/03//2024) é interessante lembrar de um arquétipo do feminino que é fundamental, não só pela sincronicidade que está rola...